sábado, 24 de novembro de 2012

Viés


"Ele me tocava. Tudo tocava com seus dedos claros. As suas pupilas dentro das minhas. Um lago parado de águas apodrecidas e talvez mas apenas e antigamente guirlandas sobre o poço refletido num lago simplesmente limpo. Ou não. Baixei os olhos: tudo que em mim se anunciava rude nele se mostrava doce. [...] eu não sabia o que viria depois. Se lhe pedir amor - porque o daria; se lhe pedir um toque - porque o faria. Não lhe pediria nada. Senti que o ritmo se acelerava pressagiando o depois em breve. Não decidi porque já não decido meus rumos: minha única preocupação é manter a fronte ereta e o porte altivo exatamente como se cantasse um hino."


Como se fosse uma
terna
eterna
interna
alterna psicose.


Como se pela primeira vez eu tivesse em mãos, em minhas mãos, uma folha em branco, inteira, inteira para eu escrever o que eu quisesse. Como se eu não pudesse dizer nada do que eu realmente posso escrever.
Eu não pude sequer dizer do quanto gosto da metáfora dos círculos concêntricos sobre o poço. E talvez, também pela primeira vez, é como se eu fosse o poço, largo, raso, profundo, absorto, e, ainda de forma inédita, inconsequente.
Os círculos são como os olhos, que eu não sei que cor têm, e que olham extasiados para o alto. Procurando a falta de contraste entre o cinza dos prédios e o cinza do céu, dos muros, da sua camiseta, das palavras sem importância dos tantos em volta.

Como se fosse tudo um grande exagero de minha parte... E todo ele estivesse assim, contido, tímido, e tão, tão meu.


"Mas percebi nos seus ombros uma desenvoltura que os meus não tinham. Seus dedos mais longos que os meus e sua boca mais livre que a minha e seus gestos debruçavam-se no ar em direção ao que desejava tocar: eu. Enveredava em direção à minha ferocidade de lobo. Sozinho em meu covil e vindo à tona e talvez pisando cuidadoso outras latitudes além da que me era mostrada. Temia. E o que queria ver: via jamais.
Quem sabe no fundo do lago alguma gruta.
Quem sabe no fundo da gruta alguma planta.
Quem sabe no fundo da planta alguma flor.
Quem sabe no fundo da flor alguma sede.
Quem sabe no fundo da sede algum lago."
Mas apenas e antigamente guirlandas sobre o poço - Caio F.

Quem sabe no fundo algum poço. Quem sabe os círculos concêntricos? Quem sabe a ambiguidade do descobrir-me.