quinta-feira, 22 de julho de 2010

Br 101, 6:19 pm.

Querido,

A tarde cai sobre os ombros da montanha, fria como o vento que me preenche de você. O trânsito está parado, os faróis dos carros apressados me lembram seus olhos, como sempre.

À minha direita, entre as árvores altas que atrapalham a minha visão ao redor da estrada, vejo as luzes pequeninas e brilhantes que circundam as águas da ilha. Luzes como as estrelas que te iluminam e a mim também, que nos unem através da distância. A lua é a mesma para mim e para ti, aonde quer que tu esteja...
Enfim, apesar da paisagem que me faz ficar na dúvida sobre sorrir ou chorar, eu queria pedir para que tu fuja. Puro sangue não deve puxar carroça; tu não deve ouvir meus reclames, que solto todos os dias, gritando minhas velhas novidades em teus ouvidos.
Sei que eu posso por um ponto final na história, ao menos nesta carta. Mas não, eu não colocarei um fim. Aonde está você agora além de aqui, dentro de mim?

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Leila.

Pediu um dia de folga ao chefe. A vida de jornalista estava a cansando e contar sobre desgraças já não era seu forte, já que tinha suas próprias tristezas. Acendeu unzinho e saiu sem destino cantarolando Coltrane. Eram duas e meia de sol a pino e ela só deveria buscar as crianças às seis. Sentou no primeiro café que viu e "um capuccino por favor?", um cigarro quase inteiro jogado ao meio fio, cof cof, esqueceu como se fuma, não é bom exemplo às meninas. Manteve sua dignidade apenas com suas unhas pintadas pela metade e os olhos um pouco borrados e úmidos, o que não chamou a antenção do rapaz atencioso que a questionou sobre colocar canela em seu capuccino. "Sim, bastante, obrigada."
Parou para pensar em seus diálogos internos patéticos e deve ter se decepcionado um pouco com o caos em que sua vida se tornara. Sábado tem cachorro-quente com as crianças na Fernanda...
_ Você tá mal hein?
_ Ah querido, eu preciso de um homem!
_ Ah Leila, eu também!
E riram com os bigodinhos de creme.

"Adoro teu olhar
Adoro tua força
E adoro dizer teu nome: Leila
Às vezes as coisas são difíceis, minha amiga
Mas você sabe enfrentar a beleza dessa vida [...]
Leila."

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Is this a heartache?

Caminhava na rua e sentiu uma forte dor no peito. Não dor de amor, comum dos romances românticos, que fazem suspirar donzelas apaixonadas ao redor dos braços de seu amado. Porque essa dor traz angústia, desespero, solidão.
Duas fortes pontadas. Pessoas atônitas ao redor de um corpo que balbuciava palavras meio sem sentido. Tudo turvo. A escuridão tomou conta.
Três dias depois aquela mulher até então sem nome acorda num lugar desconhecido, sendo desconhecido para ela também o que houve para ela estar ali.
_ Nós não encontramos documentos seus, então preciso que diga qual é seu nome.
As lâmpadas fortes sobre ela e as paredes brancas a emudeceram por uns segundos. O uniforme azul do senhor que a atendia a trouxe algum conforto, não se sabe explicar porque, mas então decidiu falar.
_ Annie.
_ Annie, você sobreviveu a um desmaio forte que te fez bater a cabeça. Ele foi causado por sobrecarga cardíaca, principalmente nas artérias Rancor, Conformismo e Solidão. Isso não é um bom sinal... O que você faz da vida?
Annie emudeceu. Mas, cabisbaixa, contou tudo ao médico que lhe trazia tanta paz.
_ Eu sou artista, pinto quadros. Não tenho mais família, eles não me compreendem, muito menos a minha arte. Diziam que era muito comercial, que eu fazia o que todos fazem; cores alegres e traços perfeitos. Então eu fugi pra longe e agora estou sozinha.
_ E o que você pinta agora?
_ O preto. E incrivelmente vendo muito mais.
O médico era apenas um médico. Mas aquela moça lhe era familiar, então ele ouviu atentamente tudo o que ela dizia, todas as palavras que ela entregava em suas mãos esperando um milagre vindo dele.
_ Pois bem senhora. Entre na segunda porta à direita. Peça alguns frascos que eu vou indicar. Não é permitido esse tipo de coisa, eu sei; mas farei isso por você. Dois frascos de alegria, dois de motivação, um de auto-estima e três de paz. Corra para comprar as tintas mais vibrantes que encontrar e pinte tudo o que puder, deixe seu rancor de lado. Eu sei que você é capaz disso.
Ela já estava atordoada por incrível semelhança.
_ Você... seu semblante... Você não é meu pai?!
Annie não precisou tomar os placebos.
Invente seu fim da história, sei que cada um guarda um
pouco dela dentro de si.

sábado, 3 de julho de 2010

When the sky rained fire.

As asas que ganhei para subir ao topo do penhasco não impediram que eu ferisse minhas mãos. E mesmo sangrando eu gritei a plenos pulmões palavras incompreensíveis para quem tem um pensamento frio e humano demais. Talvez só as nuvens pudessem entender tudo o que proferi sobre mim, sobre tudo o que vi e pude compreender somente lá de cima.
Pessoas minúsculas em meio a uma multidão que as torna menores e comuns, pequenos seres tão complexos, tão iguais, tão diferentes, tão profanos. Vi gente matando, por raiva, por amor. Vi esse amor que sinto pelas coisas e pelas pessoas em forma de lágrimas das pessoas que cativei, que sentem minha ausência, desde que fui imcumbida de subir aqui e entender daonde vim. Vi que minha necessidade não era realmente por ti, era por alguém; por isso vivi cambaleando em meio a palavras e versos e cheiros e olhares para suprir isso.
Eu vi tudo em meio a manchas alaranjadas do céu da tarde, enquanto tentava entender porque tive que partir no dia em que consegui te ter.
Não foi culpa nossa, apenas fui chamada por alguém que enunciava o dia da minha morte.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Green Grass.



- Você tem certeza? Pode ser perigoso.


- Por que perigoso? Eu estou contigo e você está comigo, é só o que importa.


- Mas lá fora está escuro.


- Vem, vem comigo.






Foram pra fora, aonde em meio aos flocos de neve que começavam a cair anunciando o começo do inverno, havia duas balanças, embaixo das árvores. E ela se sentou na balança e ele se sentou na grama fria, e ela se balançou até o alto, onde de olhos fechados podia se sentir voando. A voz dele era tão suave, tão dela, que ela não podia ouvir as palavras que ele cantarolava, apenas sentia o ritmo delas e o bater de seu coração.


As palavras são as vezes tão desnecessárias que apenas se sentiu as mãos dele a envolvendo forma inexplicável, e os flocos de neve tocando seus rostos, e as estrelas brilhando no céu. E os balanços antes coloridos agora estavam todos pintados de branco, e a grama onde se deitaram era um grande manto verde claro de manchas alvas.


E o toque era real, e a blusa com o cheiro dele era real, e o anel que agora estava em seu dedo era real. E era a prova de que ela não estava sonhando.
"Eu vou aonde você for
E a sua mão não vou soltar!"