Caminhava na rua e sentiu uma forte dor no peito. Não dor de amor, comum dos romances românticos, que fazem suspirar donzelas apaixonadas ao redor dos braços de seu amado. Porque essa dor traz angústia, desespero, solidão.
Duas fortes pontadas. Pessoas atônitas ao redor de um corpo que balbuciava palavras meio sem sentido. Tudo turvo. A escuridão tomou conta.
Três dias depois aquela mulher até então sem nome acorda num lugar desconhecido, sendo desconhecido para ela também o que houve para ela estar ali.
_ Nós não encontramos documentos seus, então preciso que diga qual é seu nome.
As lâmpadas fortes sobre ela e as paredes brancas a emudeceram por uns segundos. O uniforme azul do senhor que a atendia a trouxe algum conforto, não se sabe explicar porque, mas então decidiu falar.
_ Annie.
_ Annie, você sobreviveu a um desmaio forte que te fez bater a cabeça. Ele foi causado por sobrecarga cardíaca, principalmente nas artérias Rancor, Conformismo e Solidão. Isso não é um bom sinal... O que você faz da vida?
Annie emudeceu. Mas, cabisbaixa, contou tudo ao médico que lhe trazia tanta paz.
_ Eu sou artista, pinto quadros. Não tenho mais família, eles não me compreendem, muito menos a minha arte. Diziam que era muito comercial, que eu fazia o que todos fazem; cores alegres e traços perfeitos. Então eu fugi pra longe e agora estou sozinha.
_ E o que você pinta agora?
_ O preto. E incrivelmente vendo muito mais.
O médico era apenas um médico. Mas aquela moça lhe era familiar, então ele ouviu atentamente tudo o que ela dizia, todas as palavras que ela entregava em suas mãos esperando um milagre vindo dele.
_ Pois bem senhora. Entre na segunda porta à direita. Peça alguns frascos que eu vou indicar. Não é permitido esse tipo de coisa, eu sei; mas farei isso por você. Dois frascos de alegria, dois de motivação, um de auto-estima e três de paz. Corra para comprar as tintas mais vibrantes que encontrar e pinte tudo o que puder, deixe seu rancor de lado. Eu sei que você é capaz disso.
Ela já estava atordoada por incrível semelhança.
_ Você... seu semblante... Você não é meu pai?!
Annie não precisou tomar os placebos.
Invente seu fim da história, sei que cada um guarda um
pouco dela dentro de si.